Aquisição de Bens e Contratação de Obras e Serviços Emergenciais na Lei nº 14.981/2024
Introdução
A necessidade de respostas rápidas e eficientes da Administração Pública em situações de calamidade sempre foi um desafio para o sistema de contratações públicas no Brasil. A pandemia da COVID-19 evidenciou a rigidez das normas tradicionais de licitação e levou à criação de regras emergenciais para garantir agilidade nas contratações. No entanto, essas regras estavam limitadas à crise sanitária, sem previsões para outras situações emergenciais.
Diante das tragédias ocorridas em maio de 2024 no estado do Rio Grande do Sul, novas discussões sobre a necessidade de regras mais flexíveis para a contratação emergencial foram retomadas, resultando na edição da Lei nº 14.981/2024. Essa nova legislação estabelece medidas excepcionais para aquisições e contratações destinadas ao enfrentamento dos impactos de estados de calamidade pública.
A Lei nº 14.981/2024 altera a disciplina das contratações emergenciais previstas na Lei nº 14.133/2021 (Nova Lei de Licitações), trazendo importantes mudanças no procedimento de contratação direta, prorrogação de contratos, publicidade dos atos e adesão a Atas de Registro de Preços. Seu objetivo principal é permitir contratações mais ágeis, sem comprometer os princípios de transparência e controle administrativo.
Este artigo abordará as principais mudanças introduzidas pela Lei nº 14.981/2024, destacando seus impactos e benefícios para a administração pública em momentos de crise.
Principais Mudanças na Contratação Emergencial
A Lei nº 14.981/2024 aprimora as regras de contratações emergenciais previstas no artigo 75, inciso VIII, da Lei nº 14.133/2021. As principais mudanças incluem:
- Flexibilização da contratação direta: permite a dispensa de licitação para bens, obras e serviços em situações de calamidade pública reconhecidas pelo Poder Executivo.
- Redução dos prazos para publicação e recebimento de propostas: os prazos mínimos para licitações foram reduzidos pela metade.
- Prorrogação de contratos emergenciais: contratos podem ser estendidos por até 12 meses além do prazo original.
- Admissão de contratos verbais: em casos urgentes, contratos de até R$ 100.000,00 podem ser celebrados verbalmente.
- Criação de um Regime Especial de Registro de Preços: permite a aquisição de bens e serviços de forma mais ágil e coordenada.
- Maior transparência nas contratações: exige a publicação de informações detalhadas no Portal Nacional de Contratações Públicas (PNCP).
- Possibilidade de contratação de empresas sancionadas: se for o único fornecedor disponível, a empresa poderá ser contratada mediante prestação de garantia.
- Acréscimos contratuais maiores: possibilita alterações contratuais de até 50% do valor original.
Redução de Prazos e Simplificação do Procedimento
A burocracia excessiva nas licitações públicas sempre foi um fator de atraso na execução de serviços essenciais em situações emergenciais. Com a nova legislação, a fase preparatória das contratações emergenciais foi significativamente simplificada.
Agora, a administração pública não precisa elaborar estudos técnicos preliminares para a aquisição de bens e serviços comuns. Além disso, a gestão de riscos da contratação será exigida apenas na fase de execução do contrato, e não na fase preparatória.
Os prazos para apresentação de propostas e lances foram reduzidos pela metade nas licitações ou contratações diretas com disputa eletrônica. Por exemplo, se a Lei nº 14.133/2021 previa 15 dias úteis para a apresentação de propostas em licitações de serviços especializados, a nova lei reduz esse prazo para 7 dias úteis.
Essa medida é essencial para permitir que a administração contrate rapidamente fornecedores e execute ações de resposta imediata às emergências.
Prorrogação de Contratos e Admissão de Contratos Verbais
Outro ponto importante da Lei nº 14.981/2024 é a possibilidade de prorrogar contratos emergenciais por mais 12 meses além do prazo original.
Pela regra anterior da Lei nº 14.133/2021, contratos emergenciais tinham prazo máximo de 1 ano, sem possibilidade de prorrogação. Com a nova lei, caso a necessidade emergencial persista, a administração poderá manter o contrato vigente, desde que os preços e condições permaneçam vantajosos.
Além disso, a lei permite a formalização de contratos verbais em situações de urgência extrema, desde que o valor não ultrapasse R$ 100.000,00. Esses contratos devem ser formalizados por escrito em até 15 dias, sob pena de nulidade.
Regime Especial de Registro de Preços e Adesões
O Sistema de Registro de Preços (SRP) também passou por mudanças importantes. Agora, é possível utilizar um regime especial para contratar bens e serviços em momentos de calamidade pública.
Entre as principais inovações no SRP, destacam-se:
- Permissão para adesão de órgãos públicos afetados pela calamidade pública às Atas de Registro de Preços de outros entes federativos atingidos.
- Redução do prazo para manifestação de interesse na adesão, que passou de 8 para 2 dias úteis.
- Revisão dos preços registrados a cada 30 dias para garantir que estejam compatíveis com os valores de mercado.
Além disso, os limites para adesões às Atas de Registro de Preços foram ampliados. Enquanto a Lei nº 14.133/2021 limitava as adesões a até o dobro do quantitativo original, a nova lei permite que o total de adesões alcance até cinco vezes o quantitativo originalmente registrado.
Essa mudança visa garantir que órgãos públicos possam se beneficiar de compras compartilhadas, agilizando aquisições essenciais em situações de emergência.
Transparência e Publicidade das Contratações
Um dos maiores desafios das contratações emergenciais é garantir que a agilidade não comprometa a transparência e o controle público.
Para evitar fraudes e desperdícios, a Lei nº 14.981/2024 determina que todas as contratações realizadas sob seu regime sejam publicadas no Portal Nacional de Contratações Públicas (PNCP) no prazo máximo de 60 dias.
As informações que devem ser divulgadas incluem:
- Nome e CNPJ da empresa contratada.
- Valor total do contrato e parcelas pagas.
- Objeto da contratação e prazo de execução.
- Justificativa para a contratação direta.
- Se houve aditivos contratuais ou alterações nos preços.
Essa exigência visa aumentar a fiscalização sobre os contratos emergenciais e garantir que os recursos públicos sejam aplicados de forma eficiente.
Conclusão
A Lei nº 14.981/2024 representa um avanço significativo na modernização dos processos de contratação emergencial no Brasil. Com regras mais flexíveis, redução de prazos e ampliação das possibilidades de adesão a Atas de Registro de Preços, a nova legislação busca garantir que a administração pública possa atuar rapidamente em situações de calamidade, sem comprometer a transparência e a segurança jurídica.
Ao equilibrar agilidade e controle, a lei fortalece a capacidade do Estado de responder a crises, oferecendo soluções mais eficientes para a população afetada por desastres naturais e emergências de grande escala.
O sucesso dessa legislação, no entanto, dependerá da boa gestão dos contratos, da correta aplicação das regras e do acompanhamento dos órgãos de controle para evitar abusos e irregularidades. Com isso, a administração pública poderá agir de forma mais eficiente e transparente em momentos críticos, garantindo a continuidade dos serviços essenciais e a proteção da sociedade.